Texto e desenho de Santos Costa
Havia em Seia um ermitão de Nossa Senhora do Espinheiro que vivia em pecado com uma mulher solteira. Toda a gente sabia disso, mas calava-se. Certo dia, apareceu-lhe à porta um fidalgo careta a pedir-lhe que o deixasse entrar para assar uma carne que trazia consigo.
- Faça o favor de entrar e servir-se do lume - ofereceu ele.
Embora franqueasse a porta ao desconhecido, que vinha a uma hora tardia da noite com um pedido daqueles, não deixou de desconfiar da estranha visita. A hospitalidade era um dos lemas do ermitão, mas como estava desconfiado não deixou de prestar atenção ao fidalgo, mirando-o da cabeça aos pés. E foi nestes que achou a razão da sua desconfiança, pois o cavalheiro, em vez de sapatos, botas ou outro calçado para os pés, exibia dois cascos de bode, reluzentes como se tivessem sido ensebados.
Era ele então o Diabo?
Transido de medo, deu uma desculpa qualquer à visita, agora identificada, e tratou de ir a correr até junto da Senhora do Espinheiro. Lá chegado, ajoelhou e pediu em oração fervorosa que o livrasse do inimigo, que estava ali para o levar sem ele saber como.
Nossa Senhora apareceu-lhe em pessoa e sossegou-o desta forma:
- Descansa, que ele não te leva, porque eu te defendo. Ele dará um berro que tu vais ouvir e só depois disso é que deves regressar a casa, porque o demónio estoirará e irá para os infernos.
Dali a pouco, o ermitão ouviu em estrondo, sinal de que o Diabo tinha rebentado. Foi então para casa, ainda a tempo de ver que a assadura do visitante não passava de um sapo venenoso que o fidalgo careta lhe daria a comer para o envenenar. A partir desse dia, o ermitão emendou-se e não mais manteve relações pecaminosas.
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