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quinta-feira, 26 de novembro de 2020

ALIJÓ - A MOURA DA FONTE COBERTA - lenda nº 54

 

Texto e desenho de Santos Costa

Antigamente viveram os mouros no lugar da Chã, concelho de Alijó. Viviam em paz, não incomodavam nem eram incomodados, pelo que nem havia história se tudo continuasse nessa pacífica situação.

Uma rapariga moura, que era muito bonita, apaixonou-se por um rapaz e, sabendo que o pai dela não gostava do pretendente, namoravam às escondidas. Isso não obstou a que o pai da moura viesse a saber do namoro e logo tratasse de proibir a filha de continuar o idílio amoroso.

A moura, em vez de obedecer ao pai, que era até o rei mouro, ainda mais comprometida ficou, fazendo valer os seus sentimentos face à ira paterna. Acabou por casar com o jovem pretendente.

Furioso, o desalmado e iracundo rei tirou-lhe todos os direitos de sucessão e todos os bens e mais que fosse, expulsando-a do palácio com uma mão à frente e outra atrás, só com a roupa que trazia no corpo. Visto isso, ela foi obrigada a trabalhar, conjuntamente com o marido, para sustentar a família. Também sobre ela ficou o encargo de construir a própria casa, uma vez que o pai não lhe deixou sequer um casebre para morar.

Foi então ela que carregou à cabeça as pedras da Anta da Chã, enquanto transportava ao colo o filho de meses. Uma a uma, cada qual maior que as restantes formaram as ditas pedras as paredes e o telhado.

Em noites de luar, naquele sítio das Chãs onde se encontra a anta, ainda há quem assegure ouvir os ais da moura a carregar as pedras, como se os suspiros dela tenham permanecido no local para todo o sempre.

À Anta das Chãs, que também se chama Casa da Moura, graças à sua configuração, o povo também lhe chama Fonte Coberta, nome preferido aos restantes e por que é conhecido o local.


terça-feira, 24 de novembro de 2020

IDANHA-A-NOVA - O REI VAMBA - lenda nº 16

 

 Texto e desenho de Santos Costa

Morto o último rei dos Visigodos, era necessário encontrar-se um sucessor. O conselho dos godos consultou o Sumo Pontífice.

O Sumo pontífice disse:

- Deus revelou-me que o novo monarca será um homem bom, de ascendência real e virtuoso. Disse-me que ele vive algures, ignorado, entregue ao amanho das suas terras.

- E como o reconheceremos?

A esta pergunta de um dos membros da Cúria Romana, o papa esclareceu:

- Ele estará a lavrar com um boi branco e outro castanho. A todos os lavradores que forem vistos com bois brancos e castanhos na lavra, incitai-os a espetar a vara na terra. Se a vara que ele tiver na mão florir é sinal de que esse é que é o rei dos Visigodos.

Depois de muito percorrerem as estradas e os caminhos, os emissários papais chegaram à região da Egitânia. Depois de alguns dias sem sucesso algum, os emissários encontraram um homem a lavrar com os seus bois, sendo um deles branco e o outro castanho.

- Como vos chamais, bom homem? - começou um dos emissários.

- Chamo-me Vamba, meu senhor.

- Por que vos esforçais nesta vida dura do campo?

- Adoro a terra e tudo o que ela dá. Louvo a Deus por me continuar a dar forças para ganhar o pão para a boca e por me perdoar os pecados.

Os emissários olharam para a vara que o lavrador tinha nas mãos e pediram-lhe para a enterrar no solo.

O homem enterrou a ponta na terra. No mesmo instante, daquele pau seco começaram a aparecer rebentos e a florir.

Vamba foi coroado rei em Toledo. Reinou de 672 a 680, depois cortou as barbas e tomou o hábito de S. Bento.

domingo, 22 de novembro de 2020

FIGUEIRÓ DOS VINHOS - O SALVAMENTO DE DONA MÉCIA - lenda nº 7

 Texto e desenho de Santos Costa

Mauregato, rei de Leão, resolveu aliar-se ao califa de Córdoba, tendo este imposto ao leonês, como condição da aliança, que Mauregato lhe entregasse um tributo de cem virgens, sendo metade delas de origem nobre e a outra metade de condição plebeia. Estas virgens eram destinadas aos haréns do Norte de África.

Mauregato recorreu à sua força de caçadores, que ficou encarregada de percorrer as Astúrias, a Galiza e a Lusitânia e recolher aquela centena de virgens.

Um dos grupos de caçadores apanhou seis vítimas, de entre as quais se encontrava Dona Mécia, filha de Ramiro, o qual não a pudera defender devido à elevada idade.

Levando consigo as cativas, o grupo chegou a Alvaiázere, onde todos ficaram a saber que um certo cavaleiro, chamado Guesto Ansures, andava por aquela região com o fito determinado de libertar as cativas.

Resolveram então colocar as jovens a dormir numa cabana, enquanto eles montavam a guarda à volta daquela improvisada cela. A cabana situava-se para os lados do lugar de Portelão, a pouca distância da que é hoje a vila de Figueiró dos Vinhos. As raparigas na cabana choravam de medo, tanto mais que os captores, do lado de fora, lhes causavam terror, falando do destino que as esperava nos haréns.

Tanto riram e folgaram os caçadores de Mauregato, que todos eles acabaram por adormecer, sem saberem que Guesto Ansures já tinha atravessado o rio Alge e seguia naquela direcção.

O cavaleiro cristão Guesto Ansures, sabia que Dona Mécia, de quem se mostrava apaixonado, estava entre as seis cativas e mais lhe deu forças para cair sobre os mouros, abatendo-os.

Horas depois, Ansures devolvia Dona Mécia a seu pai, o qual abençoou desde logo o casamento entre ambos.

sábado, 21 de novembro de 2020

CELORICO DA BEIRA - A MOURA DA RAPA - lenda nº 35

Texto e desenho de Santos Costa

Na Rapa, um homem de nome Miguel sonhou que uma moura estava encantada no sítio do Alambique. Foi até lá e efectivamente encontrou uma moura sentada, que tinha ao seu lado muita riqueza em ouro. No entanto, a mulher, apesar de muito bonita, tinha o corpo de uma cobra da cintura para baixo e, de vez em quando, soltava da boca uma língua bífida, igualzinha à das serpentes.

O homem esteve vai não vai para dar meia volta e sumir daquele sítio, mas a tentação da riqueza que lhe aparecia em sonho foi muito mais forte.

-Vem até mim, bom homem - convidou a moura com um largo sorriso. - Podes crer que é para o teu bem.

- Se ele é isso, vou aceitar chegar-me um pouco mais, pois tenho tanto medo das cobras, que me pelo!

A moura recebeu-o com agrado e colocou à sua disposição todas as riquezas que ele via, especialmente um valioso galo de ouro, de tamanho natural.

- Miguel - continuou ela, como se já o conhecesse há muito - esta riqueza é toda tua, mas tens de me deixar meter a língua na tua boca.

Ele recuou, enojado:

- Ui! Isso é que não!

Ela soltou a língua bifurcada e insistiu:

- Não te farei mal, pois quero ser desencantada; e tu, no fim de aceitares o que te proponho, ficarás rico, muito rico!

- Nessa é que eu não me fio.

Vendo que ela queria ser desencantada daquela maneira, deitou-se ao galo de ouro, arrancou-lhe a crista e fugiu, deixando a mulher e cobra a gritar:

- Miguel, ingrato, que dobraste o meu encanto!

Ele nem sequer ouviu as últimas palavras.

O homem tratou de ir vender a crista do galo à cidade da Guarda e aí deram-lhe bom dinheiro por ela.


 

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

SABUGAL - O VENTO QUE SOA - lenda nº 18

 

Texto e desenho de Santos Costa

Um rapaz de Sortelha, conhecido como Zé do Feijão, encontrou um falcão perdido e apanhou-o. Ficou a saber que essa ave pertencia a um fidalgo que andara à caça e a perdera. O fidalgo oferecia grossa recompensa a quem lhe apresentasse o falcão, vivo; em contrapartida prometia castigo severo a quem tivesse morto a ave.

O Zé do Feijão, perante aquela proposta, pensou nas palavras do seu pai no leito de morte. Tinha o moribundo aconselhado o filho: “Se tiveres um segredo, que não queiras ver espalhado pelo vento que soa, não o contes a ninguém. Não o contes, seja a quem for. Guarda-o, porque um verdadeiro segredo guarda-se no coração.”

Era, pois, chegada a hora de saber se aquela recomendação do pai tinha algum valor. O que fez ele, então?

Guardou o falcão num sítio onde ninguém o visse e convidou um dos seus melhores amigos para jantar.

- Vamos comer carne de falcão - disse ele ao amigo.

 Ele então narrou como tinha apanhado o falcão, ainda vivo. Para conseguir pôr à prova o ditado, o Zé do Feijão baixou a voz e recomendou ao amigo:

- Tem cuidado e não fales disto a ninguém.

O amigo do Zé passou a andar taciturno, até que arranjou uma solução, de forma a divulgar sem divulgar. Chegou-se à beira de umas canas à beira rio e em voz baixa desabafou:

- Foi o Zé do Feijão que matou o falcão.

Um pastor que passou por ali, fez uma flauta de uma dessas canas e começou a tocar nela e o som que saía era: “Foi o Zé do Feijão que matou o falcão”.

O fidalgo quis castigar o rapaz. Levado à sua presença para receber a sentença fatal, o Zé do Feijão disse que a ave estava em sua casa, bem guardada e alimentada. O fidalgo gratificou generosamente o rapaz, que via assim cumprido o judicioso conselho do seu defunto pai.

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

ALCANENA - A PASTORA E O ESPINHEIRO - lenda nº 3

  Texto e desenho de Santos Costa

 

    Na freguesia de Abrã, entre Santarém e Porto de Mós, encontra-se um lugar que tem como topónimo Espinheiro. Este lugar situa-se junto a um monte entre charnecas, por sinal uma elevação agreste, fragosa e estéril. E esse topónimo, segundo a tradição, resulta de uma lenda.

    Era preciosamente nessa zona junto ao monte que uma pastora procurava, com o seu gado, a mando do pai. O rebanho era pequeno, de gente pobre, mas os cuidados com as ovelhas eram necessários e constantes.

    Longas horas passava a rapariga naquele lugar ermo, sem ter nada para comer, a não ser o naco de pão que levava de casa; e a passava sede, uma vez que por ali não aparecia sequer um fio de água.

    Pois foi devido à sede que padeceu certo dia, que a lenda regista. A língua secara-lhe na boca, já não conseguia gritar para chamar os animais. Lembrou-se então de recorrer ao auxílio da Virgem Maria para que pudesse encontrar água e mitigar a sede.

    A Virgem ouviu a súplica da pastorinha. Então aconteceu o milagre.

    Havia ali um espinheiro, a que os naturais chamam sarça, e encontrava-se perto do local onde a pastora estava sentada. Um sinal em forma de luz surgiu nele. A rapariga percebeu o sinal e tratou de escavar um buraco pouco profundo junto ao arbusto, de onde rebentou uma grande fonte de água.

    A jovem mitigou a sede e deu graças à Virgem.

    Sabedor do acontecido, o povo construiu uma capela no local de onde brotou a nascente, um templo revestido a azulejo e de invocação da Virgem Maria.

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

SEIA - A CABEÇA DA VELHA - lenda nº 27

 

 Texto e desenho de Santos Costa


Na Senhora do Desterro, em S. Romão, encontra-se um penedo que, pela sua configuração natural, se assemelha à cabeça de uma mulher idosa. A ele, pois, anda ligada uma lenda.

Em tempos viveu na serra uma jovem chamada Leonor, que era rica e bonita, mas que vivia sob a tutela de D. Bernardo, seu tio, e com o apoio de uma velha aia de nome Marta.

O tio de Leonor era um fidalgo cruel e despótico, não sendo para admirar que ele rejeitasse o namoro da sobrinha com D. Afonso, um fidalgo arruinado e, naturalmente por isso, muito pobre.

Para contrariarem a resistência de D. Bernardo, os dois enamorados encontravam-se às ocultas, sempre com o conluio e a ajuda da velha aia. Confiavam na velha senhora, pois ela garantira-lhes que se algum dia os traísse seria transformada numa pedra.

O acaso fez com que certo dia, vindo Marta com uma carta de D. Afonso para Leonor, o amo fidalgo, já desconfiado, obrigou-a a entregar-lha a ele. Era a marcação de um encontro, mas sem dizer o local e hora, pois só a criada o sabia. Difícil foi o tirano conseguir arrancar à velha o segredo, mas lá o conseguiu após muitas ameaças de morte.

Quando D. Afonso se encontrou com Leonor, com Marta a acompanhá-los de longe, como era hábito, incapaz de os avisar do perigo, foram alertados por gritos. Os dois apaixonados deslocaram-se ao sítio onde sabiam que Marta os aguardava e encontraram a velha transformada em pedra. Logo suspeitaram do que se passava e fugiram para a Galiza. Regressaram mais tarde, após a morte do tio, e foram ao mesmo lugar.

Lá estava a cabeça da velha Marta.

Aí mandaram erigir uma capela.