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quinta-feira, 19 de maio de 2016

ALMEIDA


A fonte romana de Leomil, das que se catalogaram pela sua serventia até metade do século passado como fontes de mergulho constitui, com uma sepultura em pedra ali vista desde tempos muito recuados, o motivo desta lenda.
Saciado, o viajante partirá sem prestar atenção à sepultura, que mais não mostra do que o talhe no granito, que almas caridosas que se prezam vão limpando de líquenes, de folhedo e de ervas que a possam esconder.
Pois é precisamente na sepultura ou melhor, por baixo dela, que se encontra o segredo da lenda, que não se abre com um cravelho, mas com uma argola embutida num alçapão. Por isso, nada de extraordinário chama a atenção do passante, a não ser o arco milenário da fonte e, segundo nos avisa a lenda, é bom que assim seja.
Por baixo da sepultura diz-se que há um alçapão, que se abre com a já sobredita argola de ferro, que esconde um pote com libras de ouro. Saber isto, é acicate suficiente para a cobiça fazer de tudo para abrir esse alçapão e retirar o pote ou, não pretendendo o vasilha, encher um saco com o conteúdo reluzente e dourado.
Engane-se, então, quem assim pensa, porque a tarefa é mais delicada do que parece e não recomenda aos expeditos que se aventurem sem saber o que podem esperar dessa atitude gananciosa.
Diz a tradição que o pote está lá, mas não se encontra sozinho, pois que uma cobra o guarda noite e dia – talvez mais precisamente noite e noite, porque não há por ali claridade no subsolo – com sanha de morder, por assim dizer, com os dentes todos, não inoculando veneno para um castigo em forma de permuta.
A cobra é uma moura encantada que está ali, não propriamente para segurar as riquezas do pote, mas para aproveitar uma oportunidade de se desencantar, deixando no seu lugar aquele que ela morder.

quarta-feira, 18 de maio de 2016

SABUGAL



Em outra lenda da Ruvina se referiu que o rei veio a esta terra, tendo antecipadamente deixado a ordem na qual uma pessoa de cada povoação, pelo menos, devia esperá-lo à sua passagem e acompanhá-lo. Da Ruvina cumpriu a obrigação uma senhora idosa, mas ao rei passou despercebida a sua presença, pelo que impôs a todos os habitantes, como castigo, um pesado encargo. Vergados ao peso do imposto, os habitantes decidiram mandar um emissário ao rei, tendo escolhido um dos vizinhos mais importantes, de seu nome Manuel Gonçalves.
Antes de partir para Lisboa, o emissário cravou um prego no sítio onde depois se construiu a igreja do Espírito Santo, dizendo:
“Aqui edificarei uma igreja se vencermos o pleito!”
Assim partiu o homem, levando consigo alguns criados e uma arca recheada do dinheiro que ele foi juntando.
Chegado à corte, o rei acedeu recebê-lo na sala do trono onde se encontrava com a rainha. O emissário disse-lhe então que o tributo era injusto, pois uma velha da povoação cumpriu a ordem real. O rei ripostou:
“Que provas há disso? Que garantias dais?”
O Manuel estendeu uma manta no chão, bem diante do rei e da rainha, onde despejou o conteúdo da arca. Os reis olharam estupefactos para a riqueza e mais admirados ficaram quando o ouviram dizer:
“O meu fiador está aqui.”
“De onde te veio tanto dinheiro?”
“Do mel das minhas colmeias e dos ovos das minhas galinhas.”
A rainha disse:
“ Colmeia que tanto dá deve todos os anos ser crestada.”
“Não” emendou o rei, “são estes os que trazem o reino em pé.”

E acabou com o tributo.

terça-feira, 17 de maio de 2016

FIGUEIRA DE CASTELO RODRIGO


Vivia na região que hoje compreende Almofala, uma bela moura de nome Salúquia. Todos lhe obedeciam. Certo dia, chegou um novo governador mouro. O seu primeiro gesto de chefia foi mandar reunir toda a gente:
 “Por ordem de Alá e depois do emir, sou o vosso novo governador. Exijo que todos me obedeçam, pois aquele que o fizer será severamente castigado.”
Salúquia, que se destacara do meio do povo, inquiriu:
“Serei obrigada a desobedecer às vossas ordens?”
“Quem manda sou eu. Se desobedeces serás castigada.”
“Se alguém me tocar, amaldiçoar-te-ei” disse ela.
O governador achou que aquela ameaça era insolência e mandou que a chicoteassem seis vezes no tronco.
 “A partir de agora não terás um dia de saúde”, amaldiçoou ela.
Pouco depois, o governador caiu à cama, doente. Os médicos não descobriram a doença.
Um dia, Salúquia encontrou um homem ferido numa perna. O homem era cristão implorava ajuda e ela acedeu a socorrê-lo, falando-lhe da maldição que tinha lançado ao governador.
“Só te sei dizer que amas esse governador”, disse-lhe ele. “Agora leva-me até àquela nascente de água.”
À medida que a água caía nas feridas, estas saravam.
De súbito apareceu o governador a cavalo, combalido. Acabou por cair da montada e Salúquia foi socorrê-lo. Ela foi até à nascente de água, colheu alguma na concha das duas mãos e deu-a ao governador, que logo ficou bom.
“Perdoai-me, senhor”, pediu ela, “daria a vida por vós”.
Queriam agradecer ao cristão, mas este tinha desaparecido. O governador e Salúquia casaram, converteram-se ao cristianismo e viveram em paz. Até hoje, a nascente que se encontra no Vale da Láxara, em Almofala, não perdeu as suas faculdades milagrosas de cura.

segunda-feira, 16 de maio de 2016

ALFÂNDEGA DA FÉ



No tempo em que os mouros dominavam o território que hoje é Portugal, havia um emir que possuía um castelo no Monte Carrascal, em Chacim. Este emir, de seu nome Abdel-Ali, era um tirano que, para além de tributar, forte e feio, os naturais, ainda lhes exigia a entrega das donzelas como tributo especial. Decretou, assim, que toda a donzela que fosse levada ao altar, a primeira noite de casamento seria passada na cama dele.
A poucos quilómetros de distância, numa outra fortaleza, situada no Castro e perto de Alfândega, mandava o cristão D. Rodrigo de Melo. Este D. Rodrigo tinha uma filha muito bela, chamada Teodolinda, a qual, receosa do direito de pernada exigido pelo emir na noite de núpcias, não queria casar.
Porém, o emir viu-a e desejou-a para si, não só para a primeira noite como para todas que a ele aprouvesse. Logo exigiu a D. Rodrigo, sob pena de lhe arrasar o castelo, a entrega da filha.
Em desespero, D. Rodrigo acorreu ao auxílio de duzentos cavaleiros de Alfândega, capitaneados por Pedro Malafaia. Quis o acaso que D. Rodrigo, quando foi fazer o pedido, levasse consigo a filha e esta se encontrasse com Casimiro, filho de Pedro Malafaia. Logo se enamoraram um do outro e a decisão de casarem ficou decidida entre ambos.
Abdel-Ali não gostou de saber a novidade e mandou os seus guerreiros raptarem a noiva no dia do casamento e antes que este se realizasse. Esta empreitada correu bem aos seus homens, porque os duzentos Cavaleiros das Esporas de Ouro (assim chamados), ainda não tinham chegado para vigiarem a cerimónia e impedirem qualquer ataque do mouro.

Levada para o Monte Carrascal, em seu socorro partiram os cavaleiros de Pedro Malafaia, entre eles, Casimiro e o pai. O embate entre os soldados mouros e os cristãos deixou o campo juncado de cadáveres, mas os cristãos lutaram com tal denodo que conseguiram vencer e entrar na fortaleza do tirano. Casimiro, que ia à frente, conseguiu entrar no quarto do emir, na altura em que este, vendo que não lhe era dado violar a noiva, se preparava para a matar com um punhal. Casimiro, que levava uma lança, trespassou o emir e exibiu a cabeça dele do alto das muralhas.

sexta-feira, 13 de maio de 2016

ALANDROAL



Junto à margem direita do Guadiana encontra-se a antiga vila de Juromenha, reedificada a sua fortaleza por D. Dinis no ano de 1312. O brasão de armas do séc. XIX ostenta um castelo, cercado por água, pendendo de cada um dos lados dois grilhões, sendo que estes significam um antigo privilégio que os seus moradores gozavam, de não poderem ser mudados para outra cadeia fora da vila sem que os tribunais pronunciassem a sentença final.
A lenda não justifica o brasão, mas o topónimo.
Conta-se que nesses primitivos tempos um nobre que era dono do castelo e dos domínios ao redor, quis deserdar a sua irmã, ficando ele dono e senhor de toda a herança paterna. Para além disso, assedia a irmã e pretendia que ela mantivesse com ele relações incestuosas.
A irmã do senhor feudal chamava-se Mênha e recusava as propostas do irmão, mormente aquela que envolvia a cupidez e o desejo de a ter como concubina. Face a essas negativas, o suserano prendeu-a na masmorra do castelo, na esperança que nessa solidão e ausência de convicções, ela dobrasse e acabasse por aceder aos seus desejos. Diariamente era formulada a proposta, mas Mênha era pronta na resposta e na jura:
“Jura Mênha que não aceita.”
Terá ela acabado os seus dias naquelas ínfimas condições, mas não de deixou vencer. Uma das torres se chama Torre da Mênha – que alguns dizem Manha - e a vila Juromenha.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

GOUVEIA


Não é conhecida pela designação que vai em título da lenda, mas sim por Calçada dos Galhardos (o que vai dar ao mesmo), o troço de via romana que de Folgosinho conduz à Serra da Estrela, Valhelhas e Famalicão da Serra. Pertencia à via romana que ligava as localidades de Linhares e Gouveia, atravessando Freixo da Serra de Folgosinho até Manteigas, troço que ainda se pode encontrar com uma largura máxima de três metros e que se distribui ao longo de quilómetro e meio.
Pois a Calçada dos Galhardos é, segundo a lenda, a via construída, não pelos romanos, mas pelos Galhardos, nome atribuído aos demónios, pelo facto de terem na testa dois galhos ou chifres.
Diz-se então que os ditos Galhardos deitaram mãos à obra para a construírem de ponta a ponta numa só noite, mas era-lhes imposta a condição de a terminarem antes do cantar do galo. Se o galo cantasse, o trabalho e a empreitada acabaria logo ali.
Muitos dos ditos já cantavam vitória, pois pouco faltava para a calçada ficar pronta, com as lajas bem assentes e o piso de montanha própria para a passagem de carroças e a pé.
A calçada ainda não estava terminada quando o galo cantou.
Um dos diabos, que queria dar por finda a tarefa, disse:
“Vamo-nos, já cantou o galo.”
E outro, que a pretendia terminar, retrocou:
“Foi o galo pardo”.
O primeiro insistiu:
“Não, foi o galo preto romano.”
Mal foi identificado o galo cantante, todos largaram o trabalho e desataram a fugir para o lugar de onde tinham vindo.
Por isso, a calçada parece estar incompleta.

quarta-feira, 11 de maio de 2016

FORNOS DE ALGODRES


Depois de muitas insistências de uma rapariga de Algodres, o povo acabou por lhe dar ouvidos. Ela dizia que sonhava várias vezes com uma senhora toda vestida de ouro, com uma coroa na cabeça, que montava um cavalo também todo branco.
Do sonho passou para a realidade e deu-se a vigiar o sítio onde a mulher aparecia. A trote, lá vinha ela sobre o tal cavalo branco e dirigia-se para a Misericórdia.
Quando falava naquela dama, a rapariga era tomada de êxtase, pelo que numa noite juntaram-se uns poucos no largo da Misericórdia para confirmarem as aparições da tal cavaleira, mas nada apareceu. Nas noites seguintes continuaram as vigias, mas da dama não viram sequer a mais ténue sombra. Estavam alguns para desistir, coléricos e despeitados, quando se deu o encontro. Estava-se na décima terceira semana do ano e passadas três luas cheias desde o primeiro de janeiro, marcando o calendário o dia 13. Eram precisamente 3 horas e 13 minutos quando viram surgir, vindo da Praça, o cavalo branco com uma donzela de vestes douradas, debruns de azul e ornamentos de estrelas, que se dirigia a trote para o castelo. Não lhes deu tempo nem ânimo de perguntarem quem era ou simplesmente darem-lhe a salvação de cortesia.
Assim se passaram 13 dias, até que na laje apareceu um estranho anão de orelhas pontiagudas e a dama a cavalo, que disse ao anão:
“Sou quem sou. Trata-me por rainha e quero informar-te, Algodres, que sejas como Jeremias, profeta de Jerusalém, que vais ter vários fogos na Barroca, ladrões que serão à chusma entre franceses, castelhanos, africanos e até daqui naturais. Vais crescer para o lado da Rasa e serás futuramente uma terra bela, acolhedora e apetecível”.
O sítio passou a ser conhecido por Laje da Rainha.