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sexta-feira, 24 de abril de 2015

ÁGUEDA


Na freguesia de Préstimo e cerca de A-dos-Ferreiros existe uma ponte sobre o rio Alfusqueiro.
Diz a lenda que um cristão encarregou-se da obra, mas quando a decidiu começar encontrou uma tarefa difícil, quase impossível. Quando já desesperava, apareceu-lhe o Diabo:
“Não te preocupes, que eu e os meus ajudantes fazemos a ponte para ti.”
“Fico-te agradecido”, disse o homem.
“Mas não tens de agradecer, pois negócio é negócio. Em troca deste favor, entregas-me a tua alma.”
Passou para as mãos do homem uma escritura e disse-lhe que a devia assinar com o próprio sangue. O homem assim fez e o Diabo confirmou:
“Comprometo-me a acabar a obra no dia de Natal, ao cantar do galo, à meia-noite.”
O Diabo e companheiros começaram a obra e na data aprazada estavam prontos a dá-la por terminada, à meia-noite em ponto. Porém, uma fada apareceu ao homem e aconselhou:
“Assim que o Diabo colocar a última pedra, atira este ovo ao longo da ponte.”

O cristão assim fez. Um minuto antes da meia-noite, quando o Diabo estava a colocar a última pedra, atirou o ovo e este partiu-se. De dentro saiu um galo e cantou. Ludibriado, julgando ter perdido a aposta do contrato, o Diabo deu um estouro e nunca mais por ali passou.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

MANTEIGAS



Consta que o deus Hermes, da mitologia grega, se veio hospedar no vale do Zêzere e em terras da serra, porque achou ser este local o ideal para se afastar de outros deuses inconvenientes. O vale do Zêzere era então um glaciar em movimento. Decidiu o Hermes estabelecer aqui o seu povo nómada de pastores com os seus rebanhos, escolhendo para junto dele os mais destemidos e os mais fiéis, tanto prontos para a pastorícia como para a guerra.
Certo dia, descobriu Hermes, entre o povo de pastores, uma mãe que embalava uma criança no seu colo. Era uma menina tão encantadora que deslumbrou o próprio deus da magia. Era com essa criança que ele queria fundar o povo ideal, capaz de apascentar os rebanhos de ovelhas e cabras, de fazer o queijo e outros produtos derivados do leite dos animais. Assim, enviou um touro, mais provavelmente um auroque, para que ele a arrebatasse das mãos maternas a criança e lha trouxesse.
O touro partiu a cumprir a ordem. Chegou junto da mãe e, com um dos chifres, pegou na criança pela roupa e partiu à desfilada, indiferente aos gritos da mulher.
Se o touro fez ouvidos moucos à gritaria, não o fizeram os pastores que se juntaram na perseguição do bovino.
De súbito, no vale, em pleno prado de pascigo e junto aos salgueiros do rio, o auroque estacou e, com o mesmo cuidado que levou no transporte, assim depositou a criança na erva.
Quando os pastores chegaram junto do animal, repararam que este aquecia a criança com o seu bafo. A mãe chegou-se sem temor junto dela e perguntou:
“Hermínia, minha filha, estás bem?”
O sorriso da pequena foi a resposta que ela esperava.

Os pastores decidiram, dar ao vale e aos montes o nome da criança, que passaram a ser conhecidos como Montes Hermínios e trataram de dar nome ao lugar: Manteigas.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

ALBERGARIA-A-VELHA


Na margem direita do rio Vouga, viveu em tempos um pescador que decidiu não casar. A sua vida era dura, a faina difícil e ele achou que não estaria à altura de sustentar uma companheira. No entanto, o seu maior desejo, mesmo um sonho, era ter um filho. Com fervor, dirigia as suas orações e o pedido a Nossa Senhora das Neves:
“Senhora das Neves, concedei-me um filho! Dai-me esse anjo!”
Nunca se esquecia de fazer o mesmo pedido em todas as orações. Até que, certo dia, andando na sua barca a pescar, viu uma caixa a boiar nas águas. Remou até ela e recolheu-a. Para sua admiração e contentamento, dentro da caixa vinha uma criança do sexo masculino.
Satisfeito e incapaz de silenciar a sua alegria, o pescador mostrou aquele “filho” a toda a comunidade piscatória.
O tempo foi passando e o rapaz foi crescendo. Ajudava o pescador, tratando-o por pai e guardando-lhe todo o respeito. Não se recusava perante qualquer tarefa, era humilde e diligente. Em determinada altura, porém, uma epidemia começou a dizimar a população e o rapaz adoeceu.
Implorou o pescador novamente a Nossa Senhora para lhe salvar o filho.
“Aqui estou”, disse Nossa Senhora. “Venho buscar o anjo que te dei para o levar até à corte dos anjos. Anjo seja.”

Como anjo da guarda da comunidade, o rapaz foi com Nossa Senhora e a epidemia acabou. A terra do “anjo seja” ficou a chamar-se Angeja.

terça-feira, 21 de abril de 2015

VILA NOVA DE FOZ CÔA


Uma mulher casada de Freixo de Numão teve necessidade de amassar o pão e verificou que não tinha água nos cântaros da casa para aquecer e misturar na farinha. Era meia-noite, mas como tinha necessidade de ter o pão cozido de madrugada, disse ao marido:
“Olha, homem, não tenho uma pinga de água para fazer a amassadura do pão. Sei que é tarde, mas tenho que ir à fonte com o cântaro.”
O homem franziu o sobrolho e disse-lhe, quase em súplica:
“Olha, mulher, não vás. Agora não vás!...”
A mulher achou a preocupação do homem despropositada, fosse ela qual fosse, pelo que teimou em ir e foi. Pegou no cântaro e dirigiu-se à fonte de chafurdo da Bica.
Quando ia a mergulhar o cântaro na água da fonte, veio um cão do escuro e rasgou-lhe com os dentes um saiote de baeta vermelha que levava vestido.
Levou o cântaro mal cheio e correu até casa, não fosse o caso de o cão voltar a atacá-la. Chamou pelo homem para lhe contar o sucedido quando reparou, mal ele apareceu, que o marido trazia nos dentes alguns fios do saiote rasgado.
“Foste tu que me atacaste?”
Para espanto dela, ele disse:
“Fui eu, sim senhor. Tenho o fado de lobisomem. Se mo queres tirar tens de me picar com um aguilhão, desde que não me atinjas os olhos. Só então o meu fado chegará ao fim e descansarei de andar como um lobo a atormentar toda a gente. Em noites de lua cheia, até ao amanhecer, tenho de me despir no meio de qualquer caminho ou encruzilhada, dar cinco voltas, espojar-me no chão em lugar onde se espojou outro animal”

Assim foi feito. Na noite de lua cheia seguinte, a mulher picou-o e acabou com o fado ao marido.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

ANSIÃO


No centro de Ansião encontra-se um painel de azulejos cuja lenda circula como razão do topónimo.
Quando a vila de Ansião ainda não passava de um pequeno lugar habitado, foi visitada pela rainha D. Isabel de Aragão, esposa do rei D. Dinis. Entre a multidão que aguardava a passagem da rainha, quase esquecido junto a um muro, estava um ancião pobre a pedir esmola para sobreviver. No meio daquela gente e sozinho, como se não participasse da receção à rainha, mal se via o pobre homem. No entanto, a rainha viu-o e chamou-o para junto de si.
“Vinde até mim, pobre ancião!”
Ele levantou-se a custo e, amparado ao seu bordão, chegou-se junto da rainha através de um corredor de gente que se afastara para o deixar passar.
Ele ajoelhou-se junto daquela formosa dama, de quem o povo dizia ser milagrosa e que também tinha a fama de acudir aos pobres que encontrava. Porém, D. Isabel pediu que ele se levantasse e ajudou a ficar de pé junto a si, passando então para a mão dele uma moeda de ouro.
Depois deste gesto de caridade, a rainha virou-se para os seus acompanhantes, a maioria deles homens e mulheres da corte, e disse, apontando o mendigo:
“Esta é a terra do ancião!”
As aias repetiram o que a ama disse. E o ancião deu o nome à terra.

domingo, 19 de abril de 2015

MÊDA


Muita gente conta, testemunhas relataram, os jornais registaram e a ciência investigou, não só em Portugal como na Itália, Inglaterra e Alemanha, os estranhos ataques que acometiam Albano Beirão, o Albaninho do Aveloso, imortalizado como Homem Macaco.
Muitos dos fenómenos foram relatados em jornais da época, outros pelo próprio e muitos deles pelos populares que observaram as extraordinárias proezas, que só podiam vir de alguém que detinha um super poder, ainda que sob a influência de uma doença intrigante. Não se diz, entre todos os casos, que fizesse mal a alguém, homem, mulher ou criança.
Conta-se que  Albaninho encontrava-se certo dia na praça da  Mêda e, surgindo-lhe um ataque, ergueu um dos assentos em pedra dos bancos que se encontram junto à igreja. Como se fosse um um mero tijolo e não um pesado bloco de pedra, ergueu-o acima da cabeça e atirou com ele ao chão, partindo a pedra em duas metades.
Dois guardas-republicanos que se encontravam perto viram a atitude e alarmaram-se. Porém, como representavam a autoridade e a atitude descontrolada do homem, aproximaram-se dele quando já lhe havia passado o ataque e se encontrava calmo.
“Estás preso!”
Os agentes da autoridade eram novos no quartel e conduziram o “preso” até junto do administrador do concelho, que ao vê-los entrar com o Albaninho inquiriu:
“Os senhores não sabem quem é este homem?”
Eles encolheram os ombros.
“Ponham-se a andar para o posto, e depressa, antes que ele faça alguma coisa.”
“Nós temos armas, podemos dominá-lo!”

“Quais armas, nem meias armas! Vão-se lá embora antes que ele vos ponha de plantão com dois tabefes…”

sábado, 18 de abril de 2015

ALIJÓ


Antigamente viveram os mouros no lugar da Chã. Uma rapariga moura, muito bonita, apaixonou-se por um rapaz e, sabendo que o pai não gostava do pretendente, namoravam às escondidas. Isso não obstou a que o pai viesse a saber do namoro e proibisse a filha de continuar o idílio amoroso.
A moura, em vez de obedecer ao pai, que era o rei mouro, ainda mais comprometida ficou e acabou por casar com o jovem. Furioso, o rei tirou-lhe todos os direitos e todos os bens, expulsando-a do palácio. Visto isso, ela foi obrigada a trabalhar para sustentar a família, conjuntamente com o marido.
Também sobre ela ficou o encargo de construir a própria casa, uma vez que o pai não lhe deixou sequer um casebre para morar.
Foi então ela que carregou, à cabeça, as pesadas pedras da anta da Chã, enquanto levava o filho de meses ao colo.
Uma a uma, as pedras formaram as paredes e, uma delas, o telhado. Dispôs os colossos de pedra de maneira a albergar a família e a durar séculos a anta que lhe serviu de abrigo e lar.
Em noites de luar, no sítio das Chãs onde se encontra a anta, ainda há quem assegure ouvir os ais da moura a carregar as pedras, como se os suspiros dela tenham permanecido no local para todo o sempre.

À anta das Chãs ou Casa da Moura, o povo também atribuiu a designação de Fonte Coberta.

sexta-feira, 17 de abril de 2015

ALCOBAÇA


Chamava-se Brites de Almeida, era uma mulher que nada devia à beleza e tinha seis dedos em cada mão. Mesmo assim, ainda teve quem a pretendesse, como aquele soldado que quis casar com ela. Brites prometeu que casaria com ele se fosse capaz de a vencer numa luta. O soldado aceitou, mas perdeu e, nesse combate, o rapaz esteve às portas da morte. Devido a esse incidente, Brites teve de fugir, foi presa por piratas e, regressada à pátria, exerceu a profissão de almocreve, fazendo-se passar por homem.
Depois dessa odisseia, Brites de Moura foi finalmente contratada em Aljubarrota como ajudante de padeiro.
Quando se deu a batalha de Aljubarrota, no dia 14 de Agosto de 1385, a padeira pegou em armas e combateu os castelhanos. Finda a batalha, onde se portou valorosamente como um guerreiro, verificou que os apetrechos do fabrico do pão não se encontravam onde os tinha deixado e que, contra o costume, a porta do forno encontrava-se fechada. Foi então abri-la e verificou, mesmo no escuro, que se encontravam ali escondidos sete castelhanos, daqueles que tinham fugido, tal como D. João de Castela o fizera, quando viram a sorte da batalha mal parada.

Com voz grossa deu ordens para que saíssem do seu forno e agarrou na pá de ferro com que costumava meter e tirar o pão do forno. Eles obedeceram, saindo cada um por sua vez. À medida que os apanhava fora, deu-lhes na cabeça com a pá, de modo que ainda despachou mais sete inimigos. Ela ficou conhecida como a padeira de Aljubarrota.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

CELORICO DA BEIRA



Sabe-se que durante a chamada Guerra Peninsular, que ocorreu entre o primeiro e o segundo decénio do séc. XIX, os invasores franceses não só conquistavam a terra e exerciam sobre as populações uma série de sevícias e assassínios, como praticavam atos de roubalheira e vandalismo por onde passavam.
Perante as aldeias abandonadas e perante uma propositada resistência das populações através do sistema de “terra queimada”, escondendo-se as riquezas, colheitas e outros bens dos naturais, era nos templos, igrejas e capelas, que os soldados de Napoleão davam largas à sua rapina ou à sua sanha destruidora.
Reza a lenda que os soldados franceses entraram em Maçal do Chão, espalhando o terror e fuzilando os moradores que não conseguiram ou não quiseram fugir. Não encontraram mantimentos que satisfizessem os seus suprimentos de campanha, pois os habitantes levaram ou destruíram o que semearam para não deixarem aos invasores qualquer meio para subsistirem.
Assim, como era seu hábito, procuraram encontrar alguns valores em ouro ou mesmo objetos que pudessem trocar por dinheiro, na igreja matriz. Não se sabe o que levaram, mas não terão esquecido a forma como vinham praticando desde que passaram a fronteira: tudo o que não lhes interessava, queimavam.

Preparavam-se então para deitar o fogo à igreja matriz, já com os archotes acesos e os rastilhos de pólvora espalhados para se propagar com maior violência o incêndio, quando os dos militares reparou que num dos altares estava um santo para eles especial e de grande devoção em França: S. Luís, que foi rei de França como Luís IX, cuja vida piedosa e a sua participação nas Cruzadas o levaram ao santificado. Perante esta imagem do santo, deixaram a igreja intacta.

terça-feira, 14 de abril de 2015

ALCÁCER DO SAL



A antiga Salácia, que hoje se chama Alcácer do Sal, foi conquistada aos mouros pelo rei D. Afonso II. Fugidos os vencidos, para trás deixaram Almira, uma criança que com o passar dos anos se transformou numa bela jovem. Depressa todos os moços cristãos por ela se apaixonaram.
Num dos parapeitos do castelo costumava ela passar longos períodos de tempo nos meses de Agosto e Setembro, a suspirar, pensando nos seus.
Certo cavaleiro cristão, um os que se tinha apaixonado por ela, decidiu escalar a muralha numa das alturas em que Almira se sentava nas sua meditações e saudades. Para ele só existia Almira.
Gonçalo, tal era o nome do cavaleiro, subiu a pulso aquela dura muralha de granito, aproveitando a face que se encontrava na penumbra.
Quando a lua nasceu, já estava ele ao lado dela, tão inesperado e veemente na abordagem que quase precipitou Almira das muralhas, tal o susto que apanhou. Ele sossegou-a e ajoelhou diante dela, baixando a cabeça em sinal de respeito e paz. Ainda ofegante pela escalada, declarou ele o seu amor perante uma atónita moura, ainda incapaz de reagir.
À luz da lua, ela reparou no rosto do apaixonado e ficou bem impressionada com aquele atrevido cavaleiro cristão, que arriscara a vida para se declarar. Estendeu os braços na direcção dele e recebeu a cabeça do jovem no seu regaço, cobrindo-a com os cabelos libertos do turbante.

Nas noites luarentas, ainda hoje o povo diz ouvir os murmúrios de Almira e de Gonçalo.